quinta-feira, 12 de novembro de 2009

AVAREZA

Diz o texto sagrado que o Espírito levou Jesus ao deserto para ser testado pelo Demônio. Essa é a missão dos Demônios: testar os homens para saber a qualidade de que são feitos.

A tentação só acontece no lugar onde mora o desejo. Ninguém é tentado a comer tijolos. Porque ninguém deseja comer tijolos. É preciso que haja o desejo para que a tentação aconteça.

(...)

Quem tem dinheiro tem todas as coisas. O dinheiro é o deus do mundo. O Vinícius inicia o seu poema O Operário em Construção citando esse texto do evangelho. O operário, no alto do monte, tentado pelas riquezas! Porque o fascínio pelo dinheiro não mora apenas no coração dos ricos. Mora também no coração dos pobres.

Avarenta é a pessoa que adora o dinheiro. Mas esqueça as imagens comuns do avarento – o pão-duro, o unha-de-fome, o mesquinho... Esse avarento é um coitado. Faz mal a pouca gente. Ele é o maior prejudicado. Da sua companhia todos fogem. Ele é ridículo. Avareza não é isso. É uma qualidade espiritual. O avarento é uma pessoa cujos olhos passaram por uma transformação: eles só vêem coisas e pessoas através do dinheiro. Todos os seus sentidos estéticos e éticos foram destruídos. Beleza, ternura, amor, honestidade, justiça – essas coisas não entram na sua contabilidade.

Por que o avarento se entrega ao amor ao dinheiro? Porque ele sabe que o dinheiro é um deus que tem poderes para operar as mais fantásticas transformações. Marx era bom teólogo; ele conhecia o poder do deus dinheiro para operara milagres. Vejam os comentários que ele fez de textos de Goethe e Shakespeare.

“Eu sou feio, mas posso comprar a mulher mais bonita para mim mesmo. Conseqüentemente eu não sou feio, porque o efeito da feiúra, o seu poder para repelir, é anulado pelo dinheiro. Como indivíduo sou um aleijado, mas o dinheiro me dá vinte e quatro pernas. Portanto eu não sou aleijado. Eu sou um homem detestável, sem honra, sem escrúpulos e estúpido, mas o dinheiro é objeto de admiração universal e portanto eu, que tenho dinheiro, sou admirado. Sou curto de inteligência, mas desde que o dinheiro é o espírito de todas as coisas, como poderia aquele que o possui não ser inteligente? Eu, que pelo poder do dinheiro, posso possuir tudo aquilo que o coração humano deseja, não sou possuidor também de todas as virtudes humanas.”

Pense nas misérias do Brasil. Elas não foram produzidas pela ira, pela preguiça, pela inveja, pela gula, pela arrogância, pela luxúria. Esses demônios são fracos. Nossas misérias são produzidas pela avareza. As delícias da riqueza justificam qualquer tipo de corrupção. Pense nas tragédias do mundo, as guerras, os genocídios... Esses sofrimentos foram produzidos pelo uso de armas que foram pensadas por inteligências científicas e fabricadas com cabeças técnicas e vendidas por amor ao lucro. Mas quem é movido pela avareza não sabe o que é o sofrimento dos outros. Perdeu a capacidade de compaixão. E com isso deixou de ser humano.

Adaptado (texto de Rubens Alves)

Nenhum comentário:

Postar um comentário